Verso daquele osreV
Na frente tem significante.
Atrás tem significado.
.etnacifingis met etnerf aN
.odacifingis met sàrtA
Na cara age o cérebro.
Na costa age coração.
.orberèc o ega arac aN
.oãçaroc ega atsoc aN
Vivemos em jaulas - - saluaj me someviV
desde o vô Cuneiforme. .emrofienuC ôv o edsed
No cabresto formal lamrof otserbac oN
de só olhar a capa. .apac a rahlo òs ed
O rompimento da semântica
O otnemipmop ad acitnâmes
com a tirana ortografia.
moc a anarit aifargotro.
Oposto de linguagem é gramática -
.ainoga mèbmat E
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Entre dois vértices apicais da sala antiga, recobrida de mármore e tacos de pau-brasil, Eneidinha saira correndo como se fugisse do Curupira; gritando por sua mãe; e em suas mãos prematuras de quatro anos, carregara dependurado um relógio Orient antigo que descobrira há minutos, propriedade de seu falecido bisavô.
__ Mãe! Mãe!
__ O quê, filha?
__ Achei um tempo.
(...)
Marcos Carneiro
Não seria, nem de longe, uma cantada;
Não, na estirpe de pobres duplos sentidos.
Pelos grilhões do faticismo, fora arrastada
à linguagem oculta de estranhos grunidos.
Onomatopéias unânimes; não existem no plano da voz.
Concebida apenas, quando no papel deitadas,
como esses corpos - luzes de brio envergonhadas -,
como esse rio - em nosso leito bebes de sua foz.
No pleito de tácitos vocativos,
são nomes, à sopros, relegados.
Encontram-se, em línguas, variados motivos
o desequilíbrio: concertos de fluentes gritados.
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(...) id
Macia pedra exótica - um soco na atmosfera;
banhada por auvo liquen, nas mãos encharcadas.
Despachadas de lacunas infindas, úlceras sombreadas,
... são elas líquidas
... adesivas
... pelo rosto coalhado, desprezadas.
Bomba carnívora - de cera; encena o desperdício.
É a arte que umidece leitos, mesas, tapetes, sublinhando a criação.
Tem, seu gradativo crescimento; erguido por pensamento,
... relaxamento,
... em vertical movimento,
... na ligeira contração.
De grandes jogos do prazer, um troféu,
erguido em anônimos e perigosos palanques;
de esportes travados sobre escuro véu
... da noite, do dia,
... na saia daquela vadia;
... dentro daquela boca, toca um céu.
É escultural, tua forma doce e aveludada,
por tantas conceituadas gnoses estudada;
um critério feminino, pra tal pueril seleção.
... Um sítio de visitas constantes,
... jazigo do ódio - e vazio - dos amantes,
válvula de escape pro nosso id p...ão.
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Tantas idas na condução;
tantas voltas num caminho demente.
Mecânico - como o dia - seu coração,
se faz contentado, não contente.
Morde o pão que amassou o diabo;
sujo deste fica, tua cárie - único dente.
Carboidrato de formato amassado;
não se faz gosto, mas nutriente.
Sobe na lage como o rei local;
não se faz coroa, mas carente.
Limpa a cárie com pasta anual;
não se faz flúor, mas fluente.
Cultua o obsceno na saia da moça;
desfile gratuito na rua indigente.
Leva o sermão - esfrega com força...
Ela não é pro seus olhos, servente!
Desce do trono, rei decadente;
dedo cortado, fica calado.
Falar é perigo de ser afogado,
pois sua vida é seu próprio solvente.
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Por beleza amiude, não compro-as em viveiro;
palco pro meu arrulho labor, não é esse vil jardim.
As apanho em cálices - faço o crime por inteiro -,
pra dar amor - tirando esses espinhos com faqueiro -,
à rosa branca que nasce - do feno - em mim.
Púrpura dama que habita ríspido caule;
é o cuidado que aqui jaz nesse intenso ardor.
Não se furta com insolente ato, a grandeza:
ovário evidente que abriga a natureza,
pra que enrijeça - morta - na estante de um senhor.
Por ausência - desse abstrato combústivel -
da paixão, relutava em vê-las sustentatas
em canteiros mórbidos, tantas fachadas.
E o que outrora era, fugaz, um sítio inteligível,
é agora amplidão - como lua - iluminada.
Minuano setentrional, leve-a para o chão!
Deleite-a no ardente solo que aqui pisamos;
dê a celerida, dê patas - pés humanos -,
e em dilema salutar, fracos, nós entramos:
poderá, á pé, nos vir em égide da paixão?
Importante, o lume da sacra escalada:
esticar os membros á altívola e aplainada
dama, que não espalha ao vento sua cor.
Tonitruante o gemido das ásperas espadas,
que lutam - em vão - protegendo as poças encharcadas deste pólen - nosso amor.
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Desde pequeno menino babão, Arlindo já se encontrara em disparidade com os demais. Pra sua fala, não tinha meio termo: tudo era pela metade. Certo dia, durante os cantos agnósticos da catequeze dominical, acompanhava a sintonia da Madre Justina:
___ Cantem, Meninos! Aveeee Mariiiiiiiiiiiaaaaaaaaa!
E Arlindo, num estampido sucinto:
___ Ave!
Desde então, todos começaram a identificar o estranho emplastro. Inclusive a Madre Justina.
___ Como é teu nome, rapazinho?
___Ar! ...
___ Ar?
___ Ar!... Se estremecia na tentativa de dizer o nome, cuja feição e esforço assemelhavam-se com uma crise de convulsão epilética. E a Madre já soltava o berro, fazendo um reveion de muriçoca.
___ Afastem-se meninos! Ele tá querendo respirar! Abana, abana!
Seu problema, se assim podemos intitular, nunca fora diagnosticado por qualquer doutor eloquente, nenhum misticismo, nenhum chá esotérico. Mas os prognósticos da boca do povo - a medicina popular - eram inevitáveis.
___ Deve tá faltando metade do cérebro, sinhá.
___Que nada, muié! É pobrema da tiróidi !
De longe alguém passando na rua, gritava pro rumo do portão:
___ Dá óleo de peroba prele tomar, que sara!
Cada um tinha o que falar sobre a introspecção do moçoilo, o qual acompanhava com olhos arregalados, como se não entendesse uma palavra que aquele mafuá de gente dizia. Não se importava.
Passado o tempo, depois de milhares de sessões de Fonoaudiologia, psicologia infantil comunicacional, acumputura da traquéia, joelhaço, e algumas pílulas pra idioitia, bruxismo, apinéia, apatia, cistite, brucelose e gagueira, Arlindo se tornara letrado em bula de remédio. Uma literatura que ele manjava com facilidade, mas ainda ostentava o problema na fala. Com o tempo e experiência, já conseguia driblar, com prudência e testes de respiração, a falha do canal comunicativo, e durante a adolescência já sabia que se tratava de uma raríssima psicopatologia da comunicação. Tão rara que só nele se observava. Depois descobriu que era um disturbio na sinapse: deveria pensar duas vezes na palavras antes de a proferir. Uma vez pra primeira metade, e outra vez pra parte suplementar.
Todo dia, na entrada do Colégio Militar, durante a ortodoxa cantoria do hino nacional - o método do duplo-pensamento ainda era ruin para o canto - , Arlindo deveria dar explicações ao Major Medeiros, do porquê de cantar daquela maneira: " Ouvi... do Ipi.... Mar... as ... cidas... de um ...herói....retum.. sol ...dade... ra... gidos.. lhou .. céu ...tria ..ne... inst... te!"
___ Não sabe cantar o hino do seu país, Arlindo!? Perguntava o Major, já sabendo do seu problema. Está com problema em algum lugar?! Se estiver, eu posso lhe ajudar com uma coronhada na fuça!
___ Na dic...
___ O quê?!
___ .. ção.
___ O quê?! Abra a boca pra falar, rapazinho! Tire essas bolas da boca e vire homem!!
E Arlindo, pressionado e coagido, tinha de ficar exercitando a velocidade de seus pensamentos da linguagem, chegando a pensar duas vezes numa única palavra, com uma rapidez fenomenal. Era impressionante seu teste de superação, apesar das palavras ficarem com um corte no meio.
___ É pro.. blema na dic..ção Se... nhor!
___ Vá se tratar, Arlindo.
Marcos Carneiro
(...) Cada tilintar do ponteiro, encaixado com o bater do seu miocárdio. Dançando sincronizado o tempo do relógio e o tempo de sua hematose, lhe proporcionando uma igualdade desconsoladora.
'O problema não é esse objeto', pensa ao olhar para o relógio de contoneira enquanto ouve o palpitar sonoro dos ponteiros em suas juntas. 'Ele também é feito em tempo. É vítima do sistema. Sempre esse tal de Sistema pra nos fazer lamuriar!' O menino acolhe o objeto, após fita-lo como uma moça quente, dando afago entre os braços cuja massa muscular ainda é perecível aos olhos. E esse gesto é o cume e quebra da inércia que lhe faltava para refinar o cérebro em grãos, num fluxo contínuo que decompõe sua existência:
- Não me cativa viver no mundo como que em briga contra o tempo. Odeio apanhar. São lutas travadas sobre gráficos; por teorias laicizantes, sob a guarda de cegas pueris deusidades; por vertigens de realidade; por diabo-a-quatro; e nós, já nos tornamos números há muito tempo: essa matemática fúnebre. Da briga contra esse perverso, eu gosto do empate; da sina ingênua de socos contra o Nada; briga de irmãos; empurrões que empapuças os queixos de raiva, descendo juntos do ringue; mãos como elos fraternos e motivados pela próxima briga; e do meu irmão mais velho - primogenito da onipotência - só espero de olhos roxos, mão arranhada; testa raspada; nariz esfolado; orgulho trancado; a indulgência sempiterna da irmandade. Inimigo do relógio é a impaciência - e oh! Chegará onde com esses passos contados? Praqueles curativos perenes de madeira, dantes não mexesse com cachorro grande, em briga contra uma longa casualidade. (...)
Marcos Carneiro
Teu nome ínclito, a essa boca morta escuta;
e escuto ao longe os ecos de tamanha rigidez.
Tua voz é canto etéreo de bela moça culta,
é lúdica música no choro de viuvez.
Meu olho pintado, beijado mais de dezena;
teu cabelo, uma estriga de nós eu lhe fiz.
E esta mão é como em tosse, o verniz;
é como em jardim morto nascer a falena.
Os teus dias mortos; frios como o calendário,
morrem em lazer, festa, trabalho;
que culpa tem o cotidiano?
Tua história - cravada - em livro invisível;
em essência é o teu crime impossível:
mirar a Lua, acertar o humano.
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Tentando, atentava - esse sujeito que me consome,
em versos falidos, tremidos, da nação Simbolista;
calar meu nome, fácil visto nas mais diversas listas,
- estranho! - estanho, escasso, escondo num pronome.
E tento, tendo tempo, por verbo trêmulo de outrora,
ganhar passagem, na linhagem de figuras de linguagem;
que metáfora morta, mata; desata nós da sintaxe torta,
na forte forca, força inteligível da intertextualidade.
Endouda pra volta; bilhete comprado.
senda torcida, remida, temida
com suas infantes razões.
Fadiga antiga, tornida, tua vida.
Prefiro, e firo, o caminho da ida;
nesse mar marcante, fluente das aliterações.
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Dor
Quão dúbio é, em traços púberes, o teu rosto!
E como bipolariza, não por ti, nem por seu gosto.
E sim, por ser fêmea da tua espécie: a tua estaca,
condição que te move desde a tua menarca.
Vinte e oito dias, trinta pra arredondar
a incessante lesão no teu álamo,
vindo como Lua, em fases, te ressecar,
desde a mensagem do hipotálamo.
Dogma fisiológico que te imprime anarquismo.
quando resolve teu metabolismo,
já em detritos - grito mudo -, dar vida à Ovogônia.
E faz-se ciclo, o teu calendário hormonal,
esse pragmatismo que te deixa na lona.
E como deixas à deriva tua nal
pelo Lh, estrogênio e progesterona.
Pra quê a discussão e tocar na palavra cortante,
se tudo depende do teu folículo estimulante?
Há de ser tocado, por nós, em tão pueril mérito
sendo dependendente apenas do teu endométrio?
Entender não posso, como o volante é pouco teu,
e muito menos eu, a bula, posso lhe atirar.
Como podemos, tal empreitada, você e eu,
se nem teu corpo e temperamento tu podes controlar?
Acalma esse martírio, mas nem tanto,
dando ao corpo lúteo a sua absolvição,
dar sequência a prole - o teu efêmero pranto:
a célula diplóide a caminho da nidação.
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"Dotô, tô cum pobrema"
A ordem do destempero
Marcos Carneiro
Dezessete
Poesia itinerante
Cada dia uma missão,
cada passo, passa o solado,
a brigar como soldado,
em guerra contra o chão.
E cada passo como fóssil
para o leitor do futuro,
como um cancro duro,
não ama, mas se faz dócil.
Mas se tem como eficaz,
o papel duplo no alvo nariz,
que ao assuar a poesia, o faz
respirar poesia de aprendiz.
Cada esquina uma palavra,
como acne - célula morta,
que em folha branca se exorta
com recorte,
en/ca/dea/mento,
di vi são.
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Tem gente que nada mais faz do que apenas sistematizar matéria teórica, dando nomes aos bois pela primeira vez.
Não é certo que esse homem tenha a plenitude de conhecimento daquilo que acontece no
mundo ao seu redor, pois até um louco - na acepção popular da palavra - pode ser erudito.
Quase sempre, é preciso dar uma surra no ego. Criança mimada que é.
Freud dispôs sobre tal instituição mental, mas não disse que carregaremos a criança no ombro o tempo todo. E se quer saber da realidade, ela nem quer saber do ego que a carregamos. Somos sempre obrigados a flexibilizá-lo ou mudá-lo completamente para atender às convenções do mundo. O homem, sendo animal político, há de ter estas obrigações quanto ao seu ego.
O sistema se impôs até em nosso ego, e principalmente nele. É duro e rígido. Mas é real.
Mas é claro que há um embate de realidades. A realidade do abraço é bem mais complacente que a do mundo. E dia 13 está chegando.
Marcos Carneiro
Marcos Carneiro
Arestas
As unhas humanas ante grades.
O punho cravado no coração
que palpita no âmago das saudades
do ato de virar as arestas das cidades,
para que encontre você.
Os olhos a pescar passado,
sua imagem a deitar no meu olhado.
E rolar, rolar, e fecha-lo
para o sonho vívido de lhe ver talhado
meus dentes secos no teu lábio.
O grito mudo a chamar-te
e você, fêmea tirana, vindo a tomar-me
os liquidos, o tempo, o pensamento.
Minha vida a contemplar a tua,
que em mim, desfila nua,
enquanto te cubro ao relento.
Marcos Carneiro
Ás vezes, tiramos férias do tempo.
Então a gente se vê como uma estátua a contemplar o passar tautológico das tardes.
No meio do ofício, tiramos férias do mundo. E fechamos as cortinas à briga das ciências, à aspereza dogmática do professor sabido. Conceitos, concertos, definições, definhações.
Olhos no quadro negro, tudo negro é, para quem há mil anos está do presente.
Passamos então a puxar o fio lineável que se esconde nas situações e que nos leva à luz da reflexão onerosa de tentar descobrir até o que não se quer, o que não se pode. O tempo concebeu ao nosso corpo, mecanismo eficazes à materializar as infidáveis preposições que o cérebro capta. Estava eu alí, no cancro rígido da cadeira, sem ser marionete dos teóricos, indagando sobre o olhar.
(...)
Eventualmente, não muito longe da realidade, tiramos férias dos olhos. Então passamos a discordar do que se vê. Não por discordar pra não querer. É discordar para que o cérebro não coloque na gaveta mais um emaranhado de pulsos elétricos. É mais fácil sentar no marasmo, do que andar na esteira da exortação.
O olhar é mecânico, é elétrico, é exato. Não é humano. Ele sabe o que faz, de forma imediata.
Olhar é contrato. E assina-se com as pálpebras, as vezes nem levantadas.
E a visão é uma senhora estudada, letrada e carismática. Política de alto calibre.
E deve ser objetivo, o olhar não se engana: olha-se tudo, ou a necessidade olha por eles.
(...)
Naquele dia, olhei de uma vez. E o olhar, mais uma vez não se enganou. Apenas tirou-se da frente para pensar no próximo olhado. E olhando pensado demais, deu no que deu: este tanto de verbetes prescindíveis à nossa prática se alimentar com os olhos o que não se alimenta com a visão.
Quanto mais você me olha, mais desejo assistir a teu olhar. É tua faca de dois verdes gumes.
Marcos Carneiro